Os desafios econômicos do transporte em 2021

Pandemia e queda nas arrecadações tornaram o atual modelo de financiamento do transporte público inviável

O medo de contágio dos passageiros acertou em cheio o setor de transporte público no Brasil. Até outubro, 13 operadoras de ônibus já interromperam suas atividades no país. Não é por menos: o seu uso teve uma redução diária em torno de 30 milhões de passageiros e prejuízo de R$ 3,72 bilhões, de março a junho, e que pode chegar a R$ 8,79 bilhões até o fim de 2020, mesmo com retomada gradual da demanda, segundo a Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU). Só em São Paulo, seis em cada dez eleitores da capital têm evitado o transporte público, dando preferência aos deslocamentos a pé e ao uso de táxis ou carros de aplicativos. Apesar dessa diversificação ser positiva, a mobilidade nas cidades depende da integração dos vários modos de transporte, principalmente com os meios públicos: o transporte coletivo ainda representa metade das viagens motorizadas do país. O desafio de fechar as contas do setor vai cair no colo dos prefeitos eleitos em 2021, quando começa a rodada de reajustes, incluindo a definição ou não de novas tarifas de transporte.

O aumento da tarifa é visto como o caminho mais fácil. Porém não deixa de ser polêmico. No passado, o seu aumento levou ao começo das manifestações de 2013 que tomaram o país. Agora, ainda tem o adicional de que muitos consumidores tiveram suas rendas afetadas pela crise. Os especialistas defendem que este momento seja usado pra criar novas propostas de investimento do transporte público. A pandemia não é o único problema do setor. Ano após ano, vem perdendo passageiros. Entre 2018 e 2019, 12,5 milhões de pessoas deixaram de usar o ônibus.

Pelo menos até surgir uma vacina, o modelo atual não deve ser viável. Com exceção de São Paulo e Brasília, que contam com recursos extratarifários, por meio dos orçamentos públicos locais, os ônibus hoje são financiados por passageiro transportado. A taxa de ocupação considerada pro cálculo da tarifa é de seis passageiros por metro quadrado no horário de pico, o que não é viável no “novo normal”. A ideia sendo trabalhada pela NTU é que a remuneração do setor mude pra custo de operação, com o risco de demanda ficando pro poder público, que também deve arcar com a isenção pra idosos e estudantes. Um modelo similar é aplicado em Londres. Lá o pagamento se dá por quilômetro rodado, mas o operador possui exigências rígidas de qualidade, como garantir todas as partidas previstas e que o intervalo entre as viagens seja regular.

Mas esse modelo sozinho não fecha a conta. A pandemia afetou os cofres públicos com a queda na arrecadação de impostos, como o ISS. Em São Paulo, os subsídios ao transporte este ano devem superar em R$ 850 milhões o orçamento previsto, segundo o Tribunal de Contas do Município de São Paulo. Pra especialistas, novas fontes podem ajudar o setor e o orçamento das prefeituras. O pedágio urbano é uma. Ou seja, cobrar uma taxa de carros particulares pra acessar determinada parte da cidade. Já tem sido adotado em cidades como Londres, Estocolmo e Singapura e já foi aprovado em Nova York, onde deve passar a valer a partir do ano que vem. O uso de apps também pode ajudar nas contas. Uma pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisa Econômicas (Fipe) mostra que a 99 foi responsável por mais de R$ 12,2 bilhões do PIB nacional em 2019. E a longo prazo, as empresas de ônibus e boa parte dos especialistas defendem ainda investir em vias exclusivas, o que torna o sistema mais eficiente ao aumentar velocidade média dos ônibus pela cidade e diminui o custo de operação.

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